23 de dez. de 2009

RAVINDRA

Kátia entrou como uma bala no quarto de Elizabeth.

- Amiga, estou apaixonada.

- Quem é? Perguntou Kátia

- Muito fôfo, rosnou manhosa Elizabeth.

- Eu conheço?

- Não, ele não é daqui.

- É de João Pessoa?

- Não.

- Lindo! Ele é uma coisa fofinha!

- Onde ele mora? Quem é a familia dele? O que ele faz? Estuda ou é um vagabundo cafajeste?

- Que agressividade é essa?

- Essa coisa existe?

- Ele é indiano e mora em Nova Deli.

- Como assim?

- Conheci-o pelo Orkut!

- E ele fala português?

- Claro que não, conversamos em inglês...

- E tu fala inglês? Diz a outra com suprema ironia.

- Um pouquinho, mas uso o google tradutor, ele quer se casar comigo, quer que eu vá morar com ele na India.

- Você está maluca.

- Ele disse que vai mandar o dinheiro para eu viajar para lá.

- Vou contar prá tua mãe.

- Naão faça isso, amiga, eu escrevo uma carta para ela depois que tudo tiver acontecido.

- Amiga eu sei que você só tem dois neurônios, tico e teco, e acho que eles devem ter tirado férias.

- Se eu não viajar logo, ele me disse que a familia dele vai obriga-lo a se casar com uma fuleira qualquer.

- Que palavra é essa?

- Ele não disse assim, mas eu entendi o sentido...

- Ele deve ser um traficante de escravas brancas, Deixe-me vê-lo...

- Promete guardar segredo?

- sim, juro...

- Pela Avó-Lua?

- Juro.

Elizabeth deu alguns cliques e abriu a página de Ravindra, um rapaz indiano de feições delicadas como uma estátua de Krishna.

- Muito fofinho! Admitiu Kátia.

- É meu. Lembrou Elizabeth.

As duas amigas ficaram olhando por um longo tempo a imagem daquele príncipe até que o descanso de tela disparou uma chuva de estrelas vinda do infinito.

- E se usássemos da magia da avó-lua para nos conectarmos diretamente com ele? Disse Elizabeth.

- Vamos fazer como vimos naquele filme.

- Qual?

_ Não importa...

Elas levaram o laptop até a janela, deram-se as mãos e sob a luz tênue da lua em quarto crescente evocaram a presença de Ravindra. Ficaram imóveis respirando rítmicamente. Cada uma em seu coração imaginou-se encontrando com ele. O encanto foi quebrado pelo toque do celular de Kátia; Dona Clara, sua mãe, ligou pedindo que voltasse logo para casa, pois já era tarde da noite.

Elizabeth foi para a sua cama com o  laptop ligado. Adormeceu.

Um barulho estranho, no entanto, despertou-a. Ela aproximou o seu rosto da tela do computador. então...

Ele tocou os seus lábios com a ponta dos dedos e suavente circulou-os com se andasse pelas margens da piscina que fica no jardim do Taj Mahal. Aproximou o seu rosto, tão perto que respiraram-se uma ao outro. O coração encheu-se de um estranho fluído incandescente, entre milhares de pixéis coloridos, todo o quarto se fazia uma única tela tridimensional de plasma amoroso. Pela fresta da porta era possível ver a intensa luminosidade que vazava para o restante da casa. A bela princesa caminhou pelo caminho de bytes, conduzida pelas mãos firmes do Príncipe e foram viver no eterno mundo da energia.

8 de dez. de 2009

O GRANDE CHEFE BOCA DORMENTE

CHEFE BOCA DORMENTE



Era uma vez... Esta é uma boa maneira de começar esta estória, pois olhando os fatos com certa distancia, eles parecem vir de um tempo mágico onde todas as coisas tomavam um colorido especial. Sempre que os astros no céu formavam certa figura, ocorria algo de inusitado na casa de Kátia e Raulzito. Numa destas vezes sem qualquer premeditação, Teodósio, o pai das crianças, chamou-as e disse:


- Hoje vamos fazer uma competição gelada. Está aqui 10 cruzeiros para cada um ir comprar tudo de picolés de todos os sabores.


Não demorou muito e estavam todos no alpendre do quintal ao redor de uma caixa de isopor.


- Vão ficar todos resfriados, disse D. Clara.


- O que adoece é a tristeza, arrematou Teodósio.


- O meu primeiro será de Morango, avisou Raulzito.


- O meu...chocolate! Disse Kátia.


- Biscoito...Disse Teodósio.


Enquanto Raulzito chupou um picolé, Kátia matou três e Teodósio cinco.


- Estou ganhando, gritou o pai.


E assim continuaram a competição sem pausa para qualquer tipo de descanso. Era um picolé atrás do outro, côco, morango, sapoti, limão, milho verde, chocolate.


-Eeeessssttttoooouuuu nnnnnaaaaa fffffrrrreeennnttttteeee! Falou Teodósio com a boca dormente de tão gelada que estava.


- Fale direito, protestou D. Clara que assistia tudo da cozinha.


- Ele parece um índio apache, ponderou Kátia, lembrando de um filme que havia visto na televisão.


- Mais respeito com o seu pai, advertiu a mãe.


- KKKKááááátttttiiiiiaaaaa ffffffaaaaallllloooouuuuu eeeesssstttttáááá ffffaaaalllllaaaaddddoooo...


- Ele é o chefe Boca Dormente, disse Raulzito que saiu em disparada para dentro de casa.


- Que é isso menino! Disse D. Clara tomando um susto.


O menino voltou com um cocar feito de papel e penas de galinha colorizadas que havia usado na escola nas comemorações do dia do indio.


- Respeite o seu pai, Raulzito. Disse Dona Clara.


- Pppppoooooddddddeeee dddeeeiiixxxaaarrr! Ordenou Teodósio.


Kátia aproveitou e buscou a sua caixinha de maquilagem e iniciou a pintura da cara do pai.


- Crianças respeitem o seu pai!. Apelou desesperada D. Clara.


Mas Raulzito e Kátia transformaram o pai num autêntico indio de televisão, que deixava-se ser manipulado pelos pequenos como um brinquedo.


Teodósio, você devia se dar ao respeito, reclamou Dona Clara.


- EEEEEuuuuu ssssooooouuuuu ooooo CCCChhhheeeeefffffeeeee BBBBBoooooccccccaaaaaa DDDDooooorrrrmmmmeeeennnntttteeee!


O isopor secou, mas o chefe deu ordem para fossem trazidos mais picolés e de mais sabores. As duas crianças correram desembestadas para a sorveteria de Juvenal.


- Teodósio, está na hora de parar com esta maluquice.


- MMMaaaalllluuuuqqquuuiiicccceee ééééé cccooommmiiigggooo mmmeeesssmmmooo. Falou o Chefe Boca Dormente sentado em sua espreguiçadeira.


- Você devia ter vergonha...


- IIIIInnnnndddddiiiiioooo nnnnnãããããooooo tttteeeemmmm mmmmmm mmmmm.


Voltaram as crianças com isopor cheio de picolés, que logo foram sendo devorados.


Mas para completar o desespero de Dona clara o Chefe Boca Dormente foi para o quintal e ficou dançando, dando voltas em circulos com as crianças ao redor do pé de cajá.


- Cccchhheeeeffffeee BBBoooocccaaa DDDDooorrrmmmeeennntttteeee qqquuueeerrr pppiiicccooollléééé! Cantavam em uníssono.


- Vão ficar todos resfriados, este vai ser o preço desta irresponsabilidade. Vaticinou D. Clara.


Somente pararam de cantar quando o Chefe Boca Dormente foi para a espreguiçadeira e relaxando adormeceu com o casal de filhos no colo.


Acordaram para o jantar, alegres e saudáveis, protegidos pela energia misteriosa do Chefe Boca Dormente.Ninguém se resfriou ou teve qualquer doença por causa daquilo. Ficou a saudade e a espera pela volta do grande chefe indio.