11 de fev. de 2008

O Guerreiro Tuareg

conto de Everaldo Vasconcelos


A irmã Neide caminhou apressada pelo corredor do colégio. Ela vinha esbaforida preocupada com algo que estava acontecendo no pátio.O seu pensamento estava como um vulcão prestes a explodir. Uma instituição antiga, que antes havia sido o seminário arquidiocesano e que atualmente se erguia imponente com as suas paredes pintadas de azul celeste no alto do Bairro do Cordeiro! Os passos dela iam se atropelando. A sua respiração ofegante e os cabelos brancos desalinhados mostravam que ela estava muito preocupada.

- "Que foi que houve, irmã?" Perguntou uma das zeladoras.

Ela não respondeu. Passou feito uma bala sem dar atenção a ninguém.

A Irmã atravessou o pátio.

Uma indefesa lagartixa correu apressada pelo muro alto que cercava o pátio. O céu era de um azul intenso. O vento estava seco e quente. Raulzito corria com desenvoltura sobre o estreito caminho. Armou novamente a baladeira e atirou fulminando o réptil. Era um guerreiro, um caçador primitivo. Com a camiseta da educação física cobria o rosto como um tuareg do deserto do Saara. Embaixo os seus colegas prosseguiam jogando futebol.

- "O que está acontecendo aqui?" Perguntou para professor de Educação Física.

- "Nada. Está tudo sob controle".

- "Como sob controle? Há um menino correndo sobre o muro do colégio atirando pedras em todas as direções".

- "Foi melhor assim..."

- "Ele está sob a sua responsabilidade..."

- "Irmã, com todo o respeito, mas este menino não deveria estar nesta escola. Ele é um psicopata mirim. Quase quebrou as pernas de dois outros garotos."

O professor continuou a sua aula. A irmã viu aquela figura correndo sobre o muro.

- "Raulzito, desça já daí!" Ela ordenou com aquela força na voz que faria qualquer outro choromingar.

Ele continuou desembestado em sua guerra particular. Ela tentou várias outras vezes sem sucesso. As pedras continuaram a voar em todas as direções.

- "Vou mandar chamar a sua mãe!" Ela ameaçou.

- "Não tenho mãe!" Foi a resposta.

- "Você é um menino de família."

- "Não tenho família, vivo jogado na rua".

- "Não diga isso, o seu pai é uma pessoa tão distinta".

- "Meu pai morreu. Sou sozinho no mundo."

- "Meu filho..."

- "Você não é a minha mãe".

- "Este muro é muito alto..."

- "Sai da minha frente senão eu lhe atiro uma pedra nos peitos."

A irmã ficou desolada. Era como se ela tivesse o próprio capeta estudando em sua escola. Benzeu-se três vezes para afastar este pensamento do juízo.

- "Não adianta rezar não, que eu só faço o que quero. Vou descer porque acabaram-se as pedras".

Quando ele pulou para o chão o futebol parou. Todos ficaram apreensivos. Ninguém teve coragem de dar um sorriso. Todos permaneceram estáticos com receio de alguma reação violenta. Ele arrumou a camiseta e caminhou solenemente para um banquinho embaixo de uma árvore.

-"Irmã, me faça um favor, deixe ele aí, até acabar esta aula", pediu o professor de Educação Física.

A irmã balançou a cabeça entre um sim e uma sensação de alívio. Depois veria o que fazer. Voltou cabisbaixa para a sua sala rezando baixinho para ele não perceber.


OOO

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